quarta-feira, 28 de maio de 2014

Princípio da Filosofia

Caos 
Quando falamos em “nascimento” imediatamente percebemos o sentido de geração de alguma coisa a partir de algo que se supõe como anterior (por exemplo: os pais são precedentes ao nascimento de um filho). Assim, ao falarmos de nascimento da Filosofia poderíamos querer estabelecer não só as condições materiais que permitiram que ele ocorresse, mas também a estrutura cultural que serviria de base para um tal episódio.

Muitas foram as discussões em que se tentou ou fazer um vínculo entre os gregos e o Oriente ou evidenciar a originalidade dos gregos em relação à Filosofia. Mas segundo o helenista Jean-Pierre Vernant, nem milagre, nem orientalismo em suas extremidades, definem o surgimento da Filosofia. Isso porque claramente ela tem dívida com o Oriente em razão dos contatos com persas, egípcios, babilônicos, caldeus – mas aquilo em que ela transformou esses conteúdos resulta em algo totalmente inovador no pensamento humano.

Enquanto muitas técnicas de previsão, cálculo etc., já existiam como práticas exercidas nas culturas citadas acima, a pergunta filosófica é inteiramente radical em relação àquilo que se tinha no cotidiano: a Filosofia pergunta sobre o que é a coisa, como é constituída a coisa, qual sua origem e causa. Mas ainda aqui há uma problemática, pois antes mesmo de se fazer essas perguntas, deslocando-as para um campo lógico-conceitual, já haviam respostas dadas que satisfaziam, ao menos temporariamente, as consciências da época.

É nesse ínterim que se desenvolveu a chamada Cosmogonia (cosmos = mundo organizado, universo; gonia = gênese, origem) que foi a primeira tentativa de se explicar a realidade. Esta era baseada em mitos (narrativas) que criavam, a partir de imagens de deuses, de seres inanimados, animais, etc., a estrutura hierárquica e organizada do mundo.
Zeus governando o Kósmos

No entanto, a Filosofia surge como Cosmologia (lógos = razão, palavra, discurso, contar, calcular), ou seja, a compreensão de que o mundo é, sim, organizado, mas os fundamentos de suas explicações não são meramente seres antropomórficos, mas conceitos de nossa própria racionalidade. A Filosofia surge para substituir o modelo mitológico-cosmogônico, pelo cosmológico-racional. Não quer dizer que o processo anterior seja irracional, mas apenas se constitui como uma lógica imanente, no sentido de se atrelar ao psicológico ou a conteúdos que deem forma aos argumentos, enquanto que a Filosofia, ao se fazer e se constituir, vai propor o modelo inverso, qual seja, em que a forma lógica constitui melhor os conteúdos do pensamento, ascendendo ao verdadeiro conhecimento.

Portanto, com essa inversão, há duas consequências: a primeira é a de requerer a autonomia do ouvinte ou em geral do indivíduo para si mesmo e não mais conferi-la à autoridade externa dos poetas, rapsodos e aedos (artistas da época); a segunda é a de que esse processo de logicização e conceitualização promove a distinção entre misticismo e racionalismo de modo a desvelar o homem a si mesmo, com suas potências para conhecer e agir justificadas na razão, ou seja, finda o agonismo (combate) entre deuses e homens e fica apenas o agonismo entre os homens, como superação do trágico de nossa existência.


  A Filosofia nasceu como ideal  de felicidade, interessou-se primeiro pelos problemas da natureza. Mas antes de o nome ser registrado já havia Filosofia e filósofos
Há algo essencial nesse saber que exige nome próprio. O amor pela sabedoria foi expresso pela primeira vez por Pitágoras (século 6 a.C.) que, elogiado por sua eloqüência e indagado pelo saber que a inspirava, afirmou não ser um sábio (sophós), e sim um amante da sabedoria, um filósofo. Surpreso com a novidade do nome, o príncipe que o admirara perguntou-lhe o que eram os filósofos. A resposta metafórica comparou a vida humana às atividades ocorridas durante os jogos públicos, aos quais uns compareciam para brilhar nos exercícios físicos; uns aproveitavam a multidão reunida e iam em busca de comércio; e outros não buscavam dinheiro ou aplauso, e sim conhecimento: lá estavam para observar. Assim, teria dito Pitágoras: “Nós viemos à existência como se vai a uma grande feira, alguns como escravos da fama, uns ambiciosos de lucros, e outros ávidos de sabedoria. A estes últimos, mais raros, chamamos filósofos.”
Inicialmente, o termo theorós referia-se a espectadores que assistiam aos jogos olímpicos, a comandantes convidados a passar tropas em revista, a uma espécie de embaixador cuja função era estar presente e contemplar. O teórico era o espectador no sentido mais autêntico da palavra, e a teoria era uma forma de participação espetacular. O verbo filosofar apareceu quando o historiador Heródoto (século 5 a.C.) apresentou a autarquia como ideal da verdadeira felicidade e considerou que a vida contemplativa ou teórica era superior, por passar ao largo das disputas materiais. A Filosofia nasceu como nomeação sob a égide da ética eudaimônica e do pensamento não-instrumentalizado. Mas antes de o nome ser registrado já havia Filosofia e filósofos. Oficialmente, a Filosofia surgiu no século 6 a.C, em Mileto. É curioso notar que teve origem em uma colônia da Ásia menor, floresceu nas colônias da Itália meridional, e só depois de um século foi acolhida no centro da Grécia, e atingiu o auge em Atenas.
Poseidon deus dos mares

Antes, as epopéias homéricas haviam tornado os deuses inteligíveis e afastado o terror relativo a forças obscuras e incontroláveis. Mas o universo continuava sujeito a comportamentos passionais e arbitrários. Raios, relâmpagos e trovões surgiam da ira de Zeus; Poseidon criava ondas e tempestades marítimas, e Apolo trazia o sol em seu carro resplandecente. Um mundo à mercê dos humores divinos é o limite de racionalização das epopéias. A primeira pergunta posta pelo novo modo de pensar, portador de tamanha exigência de compreensão que mereceu nome próprio, foi: “Qual é o princípio (a arkhé) de todas as coisas?” Os primeiros filósofos tentaram entender a natureza a partir de um único princípio organizador, dessacralizado, impessoal, lógico. Uma vez entendida a arkhé, seguir-se-ia o entendimento das coisas. Na busca de um princípio único há, implícito, um desafio ao riquíssimo politeísmo grego. Os chamados filósofos naturalistas concebiam o mundo como kósmos – uma unidade sistemática composta de elementos diversos – e a premissa fundamental era a de que a natureza funciona sempre do jeito mais simples. A confiança na uniformidade do mundo natural, na existência de um padrão regular subjacente, distinto da caprichosa e imprevisível vontade de um deus, marca a mudança de atitude acerca da origem do cosmos e de seus fenômenos.
A filosofia grega começou com os problemas da natureza e não com os relativos ao ser humano. Por que o homem se interessou primeiro pelo cosmos, e só dois séculos mais tarde por conhecer a si mesmo? Não há resposta capaz de encerrar a questão e entre diversas razões verossímeis, ressalto a relativa à beleza da Grécia. A poderosa harmonia de desenho, cor, transparências e relevos da natureza grega interpela os que a vêem. Penso ser possível estabelecer uma analogia entre a invenção da Filosofia e a narrativa mítica sobre a passagem do caos ao cosmos. No início, diziam as musas, era o Kháos, um vazio abismal e vertiginoso, em cujo seio apareceu Gaia, a Terra. Da Terra, como impulso que nela fez brotar o desejo existente em suas profundezas, surgiu Eros, o Amor Primordial. Terra-Gaia gerou então Urano, o Céu, cuja única atividade era sexual: ele ficava o tempo todo deitado sobre ela! Terra engravidou e não pode dar à luz seus rebentos, teve de guardá-los no ventre, pois Céu, sempre em cima dela, mantinha uma noite contínua, sem deixar espaço a nenhuma outra existência. Dentro do corpo materno, Krónos, o filho caçula, decidiu enfrentar o pai e – com uma foice fornecida pela mãe – cortou-lhe os órgãos sexuais quando ele a penetrava. O Céu foi assim obrigado a separar-se da Terra.
Luta de Zeus com Chronos seu pai

 Como Krónos, os gregos arcaicos precisaram abrir espaço para o autodesenvolvimento, através de mediações abstratas, entre si e a beleza que os envolvia e os interpelava. Se, na Grécia homérica, o temor aos perigos naturais levou à produção de mitos, na Grécia arcaica o belo natural provocou o Logos. Enigmática e exuberante, a natureza pedia: “Diga meu nome.” Fatores históricos modelaram a fôrma filosofia, a partir da pulsão provocada pela Beleza. Lembro que Platão considerou a beleza capaz de provocar um arrebatamento potente o suficiente para conduzir a psykhé ao mundo das idéias, ao conhecimento. Teorizar tem certo teor de estar fora de si, de sentir-se arrastado e possuído pela contemplação. Ser arrebatado é mesmo a possibilidade da teoria, cuja essência consiste em uma espécie de transe entre sujeito e objeto contemplados. Reforço a hipótese com palavras de An Introduction to Greek Philosophy1: “A região chamada antigamente de Jônia é uma das áreas mais belas e mais favorecidas pela natureza na superfície deste planeta… Com seus promontórios abruptos e grandes ilhas em mar aberto, oferece uma mistura variada de montanhas e planícies, ricas em pastagens e em terra cultivável entremeada de pomares e bosques de oliveiras. O inverno é suave, com chuvas abundantes. Nascentes copiosas e longos rios perenes ajudam a manter a relva verde durante o calor do verão. Não há clima melhor em todo o mundo… a prosperidade era inevitável.”


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA - PESQUISA REALIZADA NOS SEGUINTES SITES:
www.templodeapolo.net
www.afilosofia.com.br
educacao.uol.com.br
origem-da-filosofia.info
www.mundoeducacao.com
www.consciencia.org
www.suapesquisa.com
www.infoescola.com
www.e-biografias.net
www.brasilescola.com
www.mundodosfilosofos.com.br
 www.webartigos.com

www.conteudojuridico.com.br

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